quinta-feira, 7 de junho de 2012

Wilde III


- “Se deseja você compreender os demais, deve intensificar sua própria personalidade.” (p.1137).



         Wilde apreendeu pela leitura que sempre fora e seria um com todos. Sua própria personalidade sentiria a influência das demais, contudo, procurou desvencilhar-se ao máximo de todo cerceamento e mostrar com a revolução em seus costumes que qualquer um poderia e deveria fazer o mesmo para assim, multiplicar sua ação no mundo.

         Até a divergência de opiniões dependeria do entendimento de como ‘funcionava’ a ação do outro na sociedade. Só assim o artista poderia desvelar para este ‘adversário’ que, na verdade, a busca fora e será sempre a mesma: a felicidade. Entretanto, uma felicidade que deveria ser primeiramente individual para surtir um efeito coletivo. Acreditamos na irritação e em uma dose de impaciência que Wilde sentia em dados momentos, mas o que parecia vencer estes sentimentos nele era uma intensa complacência e compreensão por uma dor que deveria acompanhar estas pessoas que recusavam a natural alegria de viver. O movimento de utilização de máscaras deveria acelerar à medida que sentia a dor mais aguda da rejeição e a voz tornava-se ainda mais forte: “o eleito vive para não fazer nada(...)Ilimitada e absoluta é a visão daquele que descansa e observa, do que caminha em solidão e sonha” (WILDE, 2003,p.1143). Seu olhar é olhar de fogo, do fogo heraclítico, mediante o qual nada pode subsistir sem sua pluralidade e até mesmo sem suas doces contradições. Diz Nietzsche em Genealogia da moral- prólogo que “ nosso tesouro está onde estão as colméias do nosso conhecimento. Estamos sempre a caminho delas, sendo por natureza criaturas aladas e coletoras do mel do espírito, tendo no coração apenas um propósito – levar algo ‘para casa’...como alguém divinamente disperso e imerso em si, a quem os sinos acabam de estrondear no ouvido...e súbito acorda e se pergunta ‘o que foi que soou?’, também nós por vezes abrimos depois os ouvidos e perguntamos, surpresos e perplexos(...)‘o que foi que vivemos?’(...)continuamos estranhos a nós mesmos(...)). Aventurar-se em si. Não só para compreender os outros, como para se ver por inteiro.



   


                
“Não existe nenhum estado de alma, nenhuma paixão que a Arte não possa exprimir para nós, e aqueles de nós que descobriram um segredo podem fazer constar de antemão os resultados de suas experiências. Podemos escolher nosso dia e marcar nossa hora. Podemos dizer a nós mesmos: ‘amanhã, ao raiar da aurora, passearemos com o grave Virgílio pelo sombrio vale da morte’.” (p.1139).



         Passar da morte dos ideais para uma vida repleta de perspectivas. Atravessar o vale das sombras sem temor, sem procurar atalhos, sabendo que até ali haveria luz; extasiar-se e embriagar-se na penumbra sabendo que escondia clarões de existências multiplicadas. Só a arte poderia proporcionar tal vibrante estado.  Para isso, era preciso permitir a ação do sonho. Lembramos Nietzsche que no aforismo 128 de Aurora  nos diz que nada é mais nossa obra que os sonhos; nele somos matéria, forma, duração, atores e espectadores, somos nós mesmos. Fazer girar a ampulheta quantas vezes se quiser, sem achar que haveria retrocesso. Deixar o corpo sentir a leve brisa da atemporalidade, que o incentivará na ousadia de atitudes. Fruir perfumes convertidos em pura poesia; encontrar para uma dor, até que ela se torne querida, expressão de alegria - até que se intensifique o êxtase. Se consentíssemos em enfrentar o espelho – amigo inseparável de Borges -, admitindo só termos imagens para ‘ver’ e que as  aplicamos à mente de acordo com  tendências que decidimos reprimir ou professar. A descida ao ‘inferno’ do nosso eu é acompanhada pela Arte e a ela, por isso, devemos gratidão. Esqueceríamos a ‘imperfeição’ de supor a existência como coisa definida.

         O esteta continua, dizendo que “se vivêssemos o suficiente para vermos os resultados de nossos atos, poderia suceder que os que se chamam bons se vissem aflitos por um pesado remorso e que os tachados de maus pelo mundo gozariam de uma nobre alegria(...)” (WILDE, 2003, p.1126).

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